sexta-feira, junho 29, 2007

Segundos idiotas

Por André Debevc

nina simone canta
o carro preto acelera
um dia cinza
de asfalto molhado
e o coração seco
rachando os lábios
de cem tipos de silêncio.

o limpador vai e vem.
eu não vou,
você não vem.

mas uma saudade nem sei bem do que,
idiota, me fez pensar na gente.

Eu só sei

Por André Debevc

Eu não sei como eu sei. Só olho pra você e sei. E se continuar me olhando com essa cara de interrogação, vou ter que te responder com um beijo.

Jogado às leoas

Por André Debevc

Tonto e sangrando ainda pude ver
meu coração arrancado, pulsando na sua mão direita
quando aquela porta se fechou pra sempre.
Nos seus olhos,
a indiferença pensou em se esconder
mas percebeu que não ia dar tempo.
Foi a última vez que te vi.
tínhamos acabado de ser separados...
Mal tínhamos deixado o sábado
e agora era só uma questão de tempo
pra virem devorar o que sobrou de mim.

Eu estava de novo jogado às leoas.

Logo eu que criei uma religião,
com uma deusa falível, eu sei.
Logo eu que fiz do nosso amor uma nação,
com bandeira, hino e tudo,
logo eu acabei ali, deixado pra morrer sozinho.

Agora você se embriaga com sua trupe e sua liberdade
e eu engasgo na saudade um estranho desejo de nunca mais saber de você.
Tomara que as leoas me devorem,
quem sabe elas conseguem acabar o trabalho que você começou,
tomara que não sobre um pedaço de mim pra contar história.
Acabem logo com isso, me destrocem,
porque os dias têm sido cruéis demais
e não suporto mais esse coquetel de agonia e indiferença.
Você nem ficou pra ver seu estrago, menina.
Já tinha até esquecido que você só fica mesmo com o que precisa...

Jogado de um lado pro outro, entre mordidas e arranhões,
lembro que vou acordar intranqüilo e pensando em você. Dane-se.
O que dói mesmo nem é acordar com o mesmo buraco,
o que dói é lembrar que acreditei que fossemos um time,
que fossemos filhos da lua,
que achei que éramos mesmo um só
antes de até Zeus ficar com medo do nosso amor.

Codinome

Por André Debevc

te peço um codinome
pra te beijar em outro universo,
pra confessar o meu carinho
e ficar um pouquinho mais perto de você.

só te peço
um nome secreto
pra te libertar de tudo que nos impossibilita.
um segredo só nosso,
inofensivo e paralelo
que me deixe te pegar pela mão
e te mostrar uns versos e universos
onde você sorri mais perto
e me beija bem devagarinho

te peço um codinome
porque não posso te agarrar nem um pouquinho.

Seu futuro ex

Por André Debevc

Com o ar mais despreocupado do mundo ele vaga pelo universo. Três ou quatro respostas prontas no bolso costurado pela mãe, ele domina seis sorrisos diferentes fingindo não estar nem aí. Ele sabe que tem mais que merece, ele está ciente que é coisa de outra encarnação, mil karmas a seu favor, sei lá...mas ele também sabe que o relógio anda pra trás, subtrai momentos, reduz segundos, decepando lembranças de quando você sentia o vento da praia na cara, filtro solar 60 e seja o que deus quiser. Ele finge que não, mas sabe sem saber exatamente como que você e ele um dia vão ter um fim.

E aí sem saber bem porque, em alguns dias lindos ele amanhece ciumento e intranqüilo, como quem despenca do centésimo andar, como quem pisa apressado cercado de minas e incertezas. É um homem povoado de sombras futuras, do que ele viveu um dia, do que aconteceu e foi embora. O dia que raiou, inevitável e silencioso como a promessa de que tudo é passageiro. E ele coça a cueca no caminho do banheiro, e ele boceja no caminho da cozinha. Alguma hora tudo passa, ele pensa. Alguma hora a festa acaba. Aqueles olhos, aqueles traços finos e convidativos nos lábios inferiores, aquela cintura fina e os horizontes eternos em seus olhos...aquilo tudo tinha mesmo que se pôr, como o sol que morre fugindo do leblon e do pontal, como tudo que é prometido só com um quarto de vontade.

É um sujeito que já pensa muito menos nos seus olhos castanhos, seus dentes ordenados. Acabar é inevitável, ele sabe. Mas ele finge que não sabe. Ele tem oitocentas desculpas, e ele pede a ajuda do tempo, da família, de qualquer coisa que arraste a ilusão de vencer. Ele sabe que os dias estão desabando em cima dele feito uma onda de três mil metros, ele sabe que vai ser vencido. Às vezes ele se pega pensando nos seus olhos fitando outra boca, nas suas costelas se aninhando em outras mãos, sem promessas, sem viagens. Só com muito mais vontade de descobrir seu gosto, de decorar sua cor favorita, seu jeito de dizer que não, seu meio sorriso de olhar fugindo dizendo que sim. Ele anda falsamente despreocupado por aí.

Ele vaga acelerando pelas avenidas sem lembrar que seu sorriso merece mais, que seu peito acelerado não tem preço em moedas, e custa letras gestos e reticências. Ele quase não olha pros lados antes de furar o sinal e não lembrar que o suspense do que é novo fita sarcástico o primeiro beijo quente e mil vezes pensado. Olhos que se driblam enquanto as bocas ansiosas se mordem em câmera lenta. Peito descompassado, minha mão abraça sua cintura, traz sua coluna e arqueia suas costelas. Te quero inteira numa só rendição em suspiros mordendo minha orelha. Dizendo que há milênios eu tinha – mesmo calado – razão.

O beijo era esse. O cheiro era esse. O calor que te tira do sério era esse. Você dançando comigo entre mil pessoas, e esquecendo do mundo, me concedendo seu universo quente, se explodindo em milhares pra sempre. Seu sorriso na manhã seguinte como você nunca teve antes, seus olhos raiando pérolas e diamantes de acordar com, finalmente, o homem certo. Ah...nossa cumplicidade, nosso beijo. O beijo diz tudo. O fim sorrindo safado, prometendo futuros e planos. Ele nem desconfia. Ele nunca me viu. Eu te encosto meio sem querer e sorrio.

Eu te abraço e gargalho. Respiro fundo pra prender o que posso de você. O relance dos olhos. A sala repleta de desatenções e a gente se encontra. Sei sua mão nas minhas costas, te encho de olhos no descaminho do café. Nunca tomei tanto café...nunca fingi tanto não ver alguém.

Ah se ele soubesse. Vidas paralelas de quem há tempos não te quer como eu te quero. Universo estranho de quem, diferente de mim encontra seu cheiro em qualquer virada do lençol. Ele anda por aí com um ar mais reticente do mundo. E eu só queria ter certeza do que você não gosta de comer, de quando você nunca bebe e do quanto antes de dormir existe uma chance de você pensar em mim. Ele vaga por aí com o ar mais despreocupado do mundo. Seu futuro ex. Um cargo que já ocupei. Com outras mulheres, em outras histórias. E que agora quero viver com você.

quinta-feira, junho 21, 2007

Saídas Sumidas

Por André Debevc

quero afastá-la de mim mas me falta força,
quero agarrá-la para um beijo mas me falta coragem.
tenho sorrisos, palavras, tenho abraços curtos e algumas piadas,
tenho, talvez, até um bolso cheio de boas intenções...
só não tenho uma saída,
só me falta uma mísera saída heróica e real
para cada vez que a gente fica perto o suficiente para arriscar alguma coisa.

Lembrança Latente

Por André Debevc

penso em você mais do que devia
penso em você mais que podia
penso em você muito mais do que gostaria

se esqueço e penso pouco
só acontece umas vezes todo dia

somos pretérito imperfeito
e meu peito ainda conjuga você no presente,
mesmo quando não há mais “a gente”.

sei que penso em você...
já não deveria.

Cometa Paralelo

Por André Debevc

com meia dúzia de palavras te deixo completamente nua.
e não importa a avenida,
e não faz diferença a multidão letárgica...
te dispo de tudo sem nenhum receio,
e você morde o lábio inferior devagarzinho,
você desvia os olhos catando no chão alguma coisa pra cobrir sua alma.
é uma mulher sem palavras de efeito ou planos de fuga
o rosto ficando rosa, pupilas dilatadas
um riso nervoso
e o coração batendo na garganta
a falta de uma boa desculpa para correr dali sem olhar para trás.
somos um momento exclusivo onde o resto do mundo não palpita,
e tudo que você quer é que um carro buzine
que um celular toque
que alguma coisa no sistema solar te desvie
antes que você beije a minha boca
antes que você entre sem volta no meu campo de gravidade
e jogue toda essa sua normalidade pro espaço.
mas o ponteiro dos segundos acorda e pula,
a lucidez veste covardia
e balbucia alguma coisa ininteligível no seu ouvido.
o universo lembra o próprio destino e volta a se expandir
agora com um beijo suspenso
ricocheteando em galáxias distantes
passando feito cometa no céu de um lugar paralelo
onde te deixo nua e louca por mim
sem precisar de uma só sílaba.

sexta-feira, junho 15, 2007

Festa Junina

Por André Debevc

Quis rasgar todas as fotos deles juntos para fazer uma fogueira. Mudou de idéia. Qual a graça de ver um cartão de memória arder no fogo?

Louco Pelo Seu Beijo

Por André Debevc

Acordei com uma vontade louca de beijar você. Te encher de beijos curtos, depois perder um tempo quase absurdo com beijos longos, mas antes quem sabe, te ver dormir um pouco no quarto ainda com preguiça da luz da manhã que se arrasta blasé por entre as persianas. Você em paz ali, só de calcinha e camiseta velha, descansando assim de ladinho com a boca meio aberta e um sonho feliz na cabeça. Acordei com vontade de viver um dia pra te ver se espreguiçando ainda dengosa e me mandando um beijo e um com sorriso antes de me dar bom dia. Um daqueles dias perfeitos pra te ver andando descalça pela casa com os cabelos soltos e um copo com nescau demais na mão. Te ver folheando qualquer revista, pulando em cima de mim quando eu me distrair e me enchendo de ordens e beijos com seu bom humor sarcástico. Um dia pra gente ficar junto sem precisar resolver nada. Um dia pra ficar de bobeira, com um tempinho no sol talvez. Você com a mão na minha perna – que você tanto ama – e eu atento como um felino, revistando com os olhos e a alma o seu corpo pra me apaixonar de vez por qualquer detalhe que te defina, como uma pinta, uma cicatriz ou quem sabe até uma celulite. Acordei morrendo de vontade de olhar dentro dos seus olhos, de sentir o seu calor, de visitar cada traço dos seus lábios e beber do cheiro que só você tem no colo e nuca. Ah, que vontade de te puxar mais perto, te segurar daquele jeito que você adora porque te deixa louca e te faz ter certeza de que você é minha. Levantei da cama hoje pra sentir a parte mais quentinha da suas coxas e ser surpreendido pelo seu lado mais safado. Quero andar de mãos dadas até que o mundo todo feche e sorrir em silêncio no caminho de casa quando você cair no sono no carro. Acordei com uma vontade imensa de ter você pulando em cima de mim, me dizendo o quanto você me ama, me perguntando se sei o quanto eu sou sortudo e prometendo que a gente vai ficar junto pra sempre. Saudade de você, moça. Saudade de viver eu e você. O problema é que eu ainda não sei seu nome, não conheço seu rosto e nem quem você. Mas sei que a gente vai se encontrar em breve. Está escrito há três mil anos como dizia Nélson Rodrigues. Aí não se assuste se eu te perguntar: - será que eu já falei que acordei louco pra te dar um beijo?

Sem Velhas Traições

Por André Debevc

Ando cansado. Das mulheres erradas, das noites vazias, das madrugadas caras e crepúsculos ébrios. Cansado de abordagens planejadas, da caça sem recompensa ou sorriso no dia seguinte, do telefone sem rosto anotado no celular. Da intenção escancarada antes mesmo de sair de casa. Ando cansado de falar da boca pra fora, de não querer fazer força ou ter alguém pra pedir pra ficar. Ando esvaziado, de motivos pra passar a noite e acordar acompanhado, de sorriso no espelho e de histórias que não tenham deixado algum tipo de decepção ou mágoa. E quando debruço os olhos abatidos sobre a metrópole, encontro um reflexo cinza e triste. Sou eu voltando pra casa no meu corcel negro, imerso em insulfilme e músicas do Dashboard Confessionals. Silêncio na alma, buraco assombrado no peito e luzes azuis do painel refletida nos olhos. Vida que segue com esse maldito cheiro de cigarro na roupa. E no lugar que ficava o coração, uma vontade imensa de amar e nunca me trair de novo.