quarta-feira, maio 06, 2009

Revendo uma velha amada

Por André Debevc

Peço desculpas pela ausência, a culpa não é de uma emergência nem nada. É que tive que cumprir um compromisso dos mais penosos: a dura e árdua tarefa de visitar uma velha amada. O peito acelerado no avião e a tensão paquidérmica, quase obrigatória, daquela ansiedade espessa de rever um amor de tantas histórias e risadas.
Tivemos nossos altos e baixos, confesso (e amigos não me deixam mentir). Mas agora, depois de tanto tempo, penso que o fim não precisava ter sido como foi. Eu não precisava ter ido embora daquele jeito. A mala, cuia e alma pagando excesso de bagagem num aeroporto de segunda categoria. Como se tivesse fugindo de alguma coisa, fingindo pra mim mesmo que não estava fugindo dela. Eu mal me despedi. Cretino. Nem um derradeiro beijo de adeus, nem um afago prometendo guardá-la no meu peito pra sempre.
Restaram fotos, lembranças, cheiros e sons que não esquecerei nem em mil encarnações, talvez ela goste de saber disso, sei lá. Mas também sobraram silêncios e notícias eternamente incompletas de como ela andava. Ouvi de tudo, e não soube exatamente de nada. Mas pra mim sempre vai ficar a imagem da minha velha amada, no auge da sua forma. Sem as marcas inapagáveis do tempo e de relações erradas. Toda em pézinha, como ninguém nunca mais verá. Tínhamos uma intimidade de noites a sós invejada por amigos e conhecidos que nos viram juntos.
Indo ao seu encontro, devo admitir que foi um erro não vê-la por tanto tempo. A gente tinha uma história, tinha uma coisa especial um pelo outro, eu sei. Só de vê-la se aproximando, com aquele jeito dela de achar que é única, já fico eufórico. Preciso me conter. Se eu suasse nas mãos, encharcaria meu passaporte agora. Desse jeito vou acabar me entregando. Manhattan, te amo.

Em São Paulo (I)

Por André Debevc

Ando tranquilo. Sem lugares de onde preciso fugir, sem mulheres onde preciso chegar. O peito devidamente ocupado e uma casa com o cheiro dela, que amo, pra onde eu posso voltar todos os dias. Até de carro troquei, pra poder levar a vida mais devagar, enquanto os finais de tarde bonitos de outono voltam silenciosos aos céus polarizados de São Paulo. Da cobertura do casarão, onde troco meus dias e pensamentos por dinheiro, vejo o sol fugindo pra de trás de Osasco enquanto a lua sorri, desembarcando em Congonhas e atravessando Moema. Na vida, só mesmo o trabalho anda insano, num engarrafamento de projetos, fundindo idéias, atropelando madrugadas na frente do powerpoint. Mas é São Paulo, o que mais eu podia esperar? Fora o trânsito e a falta de praia, confesso que gosto daqui. Não é sempre assim não. É só porque por quase a metade do milésimo dia seguido, acordei tranquilo.