terça-feira, setembro 27, 2011

Só um filminho noir

Por André Debevc

A luz gris que escapa da TV de tubo desregulada se mistura à luz âmbar do abajur dando um certo granulado quase noir ao quarto, aquecendo o encontro que é, em algum outro universo, apenas clandestino. Só seus pés estão escondidos sob a aba da coberta enquanto sua coxa esquerda atravessa a cama para pousar entre as minhas pernas. Falamos amenidades dessas nossas almas espelhadas em papéis tão distantes. Você quase sem querer descansa o seu peito perfeito sobre mim. Neste momento, o nosso universo, todos os universos, cabem nessas quatro paredes (uma que na verdade é só um blackout e cortina) e lençóis que ladeiam e esquentam sem precisar nos cobrir. Você sempre diz que nada te esquenta mais que um outro corpo nu colado ao seu, não é mesmo? E você tem razão – sempre tem razão de um jeito ou de outro – ainda mais nessa sua mansidão sua depois de gozar. Acho que de todas as vezes, essa é a vez em que te vi mais calma de todas. Falando mansa, a virilha ainda morna sobre minha perna. O sotaque indefectível, o tom ameno e um cheiro incrível que parece emanar do seu colo só para tomar conta de todo o mundo. Temos cortes secos e closes, muitos closes de detalhes, boca, anca, peito, coxa, olhos. Tudo muito bem editado e montado. O beijo funcionou bem, é claro, ou não estaríamos aqui, lambuzados, repousando sem pressa de mais. Desse filme noir nosso, sem câmeras ou coadjuvantes, dividimos a direção. A trilha sonora é outra coisa que inevitavelmente teríamos que fazer juntos. Olhos nos olhos. Com você em cima, de preferência.