terça-feira, setembro 11, 2007

A Primeira Noite de Um Homem

Por André Debevc

O sol começava a dar o ar de sua graça no horizonte atrás do Pão de Açúcar pintando o céu daquele janeiro de lilás e laranja. Ajoelhado no sofá olhando os poucos carros que rasgavam a Jardim Botânico meu coração acelerado batia na boca e não me deixava dormir. O dia que ensaiava acordar me reservava uma resposta importante. Diria até que naquele verão de 1991 era a resposta (no exagero típico de adolescente) mais importante da minha vida. A menina mais linda de todo o universo – e que agora já era responsável pela minha primeira noite em claro – se pronunciaria sobre a sua escolha entre mim e outro moleque (penso agora em como é engraçado como aos 16 anos, você se coloca em situações como essa, disputando a atenção e o amor da menina mais linda que você já viu com um sujeito que atende pelo apelido de Rato).

Naquele dia nem eu nem Rato ficamos com ela. Era difícil demais escolher um, ela me diria mais tarde. E se ele pintou alguma bobagem no chão da rua, na frente da janela do segundo andar onde ela ficava, eu contra-ataquei com palavras sinceras e um coração acelerado tentando fazer ela mudar de opinião. Não adiantou. Ali o empate estava selado. Mas naquele dia, mesmo sem ninguém ganhar o beijo tão desejado, eu senti que perdi. Talvez a primeira e mais profunda de muitas outras derrotas que viriam no meu caminho amoroso. Rato nunca realmente a quis com coração. Estava na briga apenas porque ela era linda, e ele queria aquele troféu. O amor, por mais sincero que fosse – como depois eu comprovaria ao longo da vida – não me fortalecia em nada.

Semanas depois, ela voltaria para o interior – pois é, acho que todo homem na adolescência tem uma paixão que vem do interior – e eu e Rato ficaríamos no Rio, comparando quem afinal tinha chegado mais perto do beijo da menina mais linda do universo. Se minha memória não está me enganando, acho que foi ele, paciência. Vida que segue.

E a vida seguiu mesmo. Notícias da menina mais linda do universo, só espaçadas de uma tia dela que eu encontrava por ali na vizinhança. Até hoje quando passo em frente àquela janela de segundo andar penso em como eu ficava quando estava perto dela (da menina, não da tia). Meus olhos indecisos dançando entre a boca de milhares de sorrisos perfeitos e os olhos caramelo mais brilhantes e vivos que já vi. Como era linda. Seus cabelos longos, lisos e escuros que cismavam em se agarrar nos lábios que eu tanto queria beijar. Eu realmente amava aquela menina...

Mas o tempo passou. E de repente nunca mais se soube nada da linda menina. Eu já era homem feito. De barba na cara, já tinha me apaixonado, amado e sofrido. E viajava com meus amigos querendo colecionar conquistas e histórias pra contar em cidades distantes e pequenas. Feiras agropecuárias, feriados, férias de faculdade, carnavais. E lá pelos vinte e poucos anos de idade a diversão era passar o carnaval em Minas. Mais precisamente na cidade da família de um amigo de infância que ficava ainda mais divertida quando a gente chegava com tantos outros amigos.

A folia corria nos conformes com cerveja, idas à cachoeira, bagunça na casa alugada numa ruazinha transversal da cidadezinha e amassos aleatórios com conquistas fugazes de carnaval. No entra e sai da casa nunca trancada, a noite de domingo ficava pra trás com o desfile da única escola de samba da cidade. E depois de um dia de sol e cerveja nos tombos da cachoeira, eu já vagava pela rua indo pra casa de uma vez por todas. Rumava ainda indeciso até que depois de tantos anos querendo ver a menina mais linda do universo, meus olhos atenderam minhas velhas preces e, abertos, realmente a viram.

Era ela, distraída, em pé sozinha no meio da rua de paralelepípedos e sonhos. E antes que meu coração saísse pela boca, consegui passar pela garganta o apelido dela e gritei. NUNCA na vida alguém se virou para mim numa câmera tão lenta. E em plena rua principal de uma cidade pequenininha perdida no cantinho esquerdo de Minas Gerais, o meu mundo parou.

A surpresa de encontrá-la ali naquele fim de mundo não era só minha. Quase seis anos tinham se passado e ela só tinha ficado ainda mais linda, a menina mais linda do universo. Agora uma mulher. Agora ali sorrindo o seu sorriso perfeito a poucos passos de mim. Conversamos nos olhando nos olhos mais do que nunca. Nos abraçamos, nos demos as mãos. Não acreditamos juntos.

E no meio da folia, tudo pareceu sumir. E nossos silêncios impontuais eram quebrados por comentários sobre aquela coisa do destino, nos colocando ali, frente à frente depois de tanto tempo. Relembramos nossa saga. Meus poemas e a rua pintada. Nunca tínhamos esquecido um do outro. E aí sem saber exatamente como, eu a beijei numa madrugada de carnaval. E foi bom. E foi muito melhor do que eu tinha sonhado tantas vezes quando adolescente. E ali, num dos lugares mais perdidos do planeta, eu me senti o dono do mundo. Eu e a menina mais linda do universo. Saímos dali de mãos dadas e sorrisos estampados. O que tinha que ser, finalmente era – lembro que pensei.

Depois disso namoramos um namoro à distancia, que não me deixou viver com ela nem um milésimo do que queria ter vivido. Mas a história já estava escrita. Um amor com um fim. Anos depois de passar a primeira noite inteira acordado por alguém tive muito mais do que pensava. E fui namorado da menina mais linda do universo. Uma menina que eu não soube ver mulher, e que há pouco um site desses de relacionamento me trouxe de volta. Casada, bem sucedida e feliz como ela merece ser. Linda com os olhos brilhantes e doces como pra mim ela sempre será.

3 comentários:

Anônimo disse...

Lindo, emocionante, tipo do texto q prende sua atençao até o fim, e vc se envolve e torce e chora...
alimentou meu coração, completou meu dia q não estava muito bom...
Parabéns Dé! Homens sensíveis como vc são raros!
bjs

Anna Soares disse...

ai ai...

Anônimo disse...

Amei, amei, amei. Não costumo gostar de textos longos em blog, mas a Isa tem razão, vc conseguiu prender a atenção de todos.
O melhor foi o final, mantendo a ternura da personagem, mesmo depois de tanto tempo.