segunda-feira, novembro 17, 2008

No box (ele)

Por André Debevc

Sentado no chão do seu box blindex há mais de vinte minutos, ele pensava numa frase de Balzac enquanto a água quente descia quase sem pressão do chuveiro chinfrin comprado na lojinha da vizinhança. A sorte de uma relação amorosa depende da primeira noite, dizia o velho romancista.

Com a água escorrendo as suas costas e nenhuma preocupação com o tempo, ele pensava em toda a verdade da frase enquanto pensava na sua nova aspiração amorosa. Imaginava na verdade, já que a exatidão das curvas, do tom de rosa e raio exato das auréolas dos, provavelmente, empinados peitos de seu objeto de desejo eram até ali apenas suposição de sua mente fantasiosa e um tanto indecisa.

Macaco velho de guerra nas noites, bagagem não lhe faltava para saber que nenhuma primeira noite acontece em flashes sépia ou closes elegantes em câmera lenta. Lances com imagem granulada, só em dias seguintes. E mesmo assim, dependendo do álcool.

Era um desses raros sujeitos realmente atentos ao detalhe. Sem vulgaridades ou babaquices de pornografia desnecessária. Desses caras que lembra de besteiras ditas sem qualquer intenção – todo mundo conhece um, né? Do tipo que mapeia corpos e idolatra fragmentos e temperaturas que fazem de cada mulher uma criatura completamente diferente da outra.

Gosta de mulher de verdade. E é cético em relação à mulheres de capa de revista, todas refeitas com Photoshop, segundo ele. Imperfeições e detalhes são o que realmente o movem. Não pode ver uma mulher com uma leve cicatriz no rosto. Charme pessoal e intransferível, gosta de dizer. Sabe que a gravidade e celulites acontecem - fazer o quê, né? – e só acha mesmo que começa a pensar numa moça quando ela provoca nele aquela indefinível vontade de colocá-la na boca. Só não aprova sutiã com enchimento. Porque isso é propaganda enganosa.

E foi visitando imaginariamente, e sem nenhuma pressa, cada milímetro do corpo, sinal de nascença e cicatrizes do objeto de sua atenção, que ele ficou. De olhos fechados, sentia cada gota morna que viajava do chuveiro até seu corpo. Tudo tem seu tempo, pensava.

O melhor jeito de decorar o cheiro de sua nuca. A descoberta do calor de suas coxas. O último olhar dela antes dele lhe tirar a calcinha. A primeira vez em que a visse nua, ansiosa, com todo pêlo da alma em guarda, arqueado, esperando o bote. Tudo tem seu tempo. Tudo.

Amores, desilusões, sonhos e promessas feitas ao pé do ouvido. Tudo tem seu tempo. Como a água que escorre pro mar, partindo ali dos seus pés junto ao ralo. E pra ele, que não gosta lá muito de esperar, este tempo só pode ser agora.

7 comentários:

Fernando Amaral disse...

Gol.

Vanessa Dantas disse...

Juro! Me faltou ar...

Hugo Rebelo disse...

Que delícia!.

Tem que colocar uma ferramenta que permita seguir o seu blog com mais atenção.

saudações

http:\\coresemtonsdecinza.blogspot.com

Jongleuse disse...

Ansiedades e expectativas do começo...
Delícia.

Anônimo disse...

Quando é assim, não tem como deixar passar...
Não aproveitar esse momento tão esperado é se arrepender no futuro...

Anônimo disse...

ai,ai, ai, ai...sr. andré!
isso não se faz com as pobres leitoras...ô judiação!!

MáhH ~ disse...

Devia ser proibido arrancar suspiros nossos desse jeito.