domingo, agosto 01, 2010

(poema de 1998)

Por André Debevc

Até que não posso reclamar demais,
tenho um Mustang ‘65 conversível que vai a cem enquanto você pisca.
Posso sair do meu bairro nova iorquino de ruas sem nomes
e acabar em Ipanema num fim de noite qualquer,
nem preciso passar pelo eixo monumental
perto de onde fica o cativeiro do meu último coração;
dirijo intranqüilo na chuva escura de estradas adormecidas.
Toca qualquer música no meu rádio importado,
ouço o que era um dia o ritmo do meu peito
no embalo arrastado do limpador de pára-brisas.
Abro a janela,
deixo a chuva me beijar desesperada e metódica,
pisco vazio e distante de mim mesmo,
encontro meu olhar
num desvio cinza do espelho quase embaçado,
estou seco na normalidade de sempre
lembrando de cheiros que o vento levou molhados,
e suspiro fundo,
concentro na chuva,
no dia cinza da rotina preto-e-branco
que aparece em meu retrato grudado na identidade.
Nova York parece tão perto.

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