quarta-feira, abril 12, 2006

É isso...

Por André Debevc

Lamento, mas não posso. Não, menina, não vou ser um desses que inventa mil desculpas ou some sem pistas de uma hora para outra. Não tenho mais
a saudável maldade adolescente de mentir que vou ficar para sempre só porque tenho tesão. Passei dessa fase da vida – pelo menos no meu tempo
de moleque era assim – onde eu precisava omitir umas verdades para poder ter companhia, uns beijos, um peito na boca e uma coxa nas mãos. Cheguei nesse ponto sincero onde prefiro não iludir, ganhar pontos com o Velho lá de cima e dormir com a consciência limpa.

É verdade, eu lamento. Quando te disse que não tenho medo de quase nada, eu tava falando sério. Nunca me vi como um desses homens com medo de compromisso. Vai ver fiquei tempo demais sozinho. Vai ver fiquei comendo muito tempo só pelas beiradas. Vai ver no fundo acho que não vou conseguir ser o melhor que posso ser pra você. Que você merece mais, essas bobagens.

Acho que travei quando vi meu mundo ameaçado. Eu sei, é bobagem, você nunca fez nada, você nunca teve essa intenção, mas essas cada vez mais novas velhas manias acabam tomando conta da gente. Talvez seja o peso dos anos. Talvez esteja ficando velho, não sei. Vai ver que na falta de alguém de verdade acabei me apegando à coisas pequenas como a liberdade de ir e vir sem ter que consultar alguém.

Às vezes suspeito que virei um dos meus piores pesadelos: um coyote solitário. Eu, o asfalto e o vento na cara no caminho de casa. Quase um filme em preto-e-branco. Poeira e trilha seca como a boca do dia seguinte. Aquele odor intruso de sexo. Uma música, um sorriso canalha de quem saiu na hora certa...o sol na cara de uma manhã sem ressaca e camisa amassada.

Sério mesmo, desculpa. Durante muito tempo achei que a culpa era de um dos meus fantasmas: a ex que eu nunca esquecia. Ela, que sem nem lembrar que eu existia, nunca deixava que eu amasse mais ninguém. Mas hoje sei que não é isso. Não agora. Não com você. Sério mesmo, menina. É que tô cheio dos velhos vícios dessa vida desregrada: horários loucos, amigos mal intencionados por todos os lados. Sei que a frase é péssima, mas não é você, sou eu. Sei que disse que queria alguém com quem dormir abraçado e ver dvd no domingo. Sei que te disse que queria dar uma acalmada, sair dessa vida, ser de alguém, cultivar apelidos e fazer meia dúzia de planos. Sei disso tudo, mas também sei que não menti em nada. Sou isso, transparente, que você tá vendo. Poço de sinceridade amarga. Desculpa, você prefere as coisas mais doces...

É só que pra gente dar certo, eu não tinha que estar aqui só porque não achei uma boa desculpa, ou a cara de pau de dizer que preferia não ter que fazer força, colocar uma calça e uma camisa e sair da minha velha rotina. Não, não olhe pra mim assim. Você devia saber que pra gente dar certo eu tinha que não pensar nessa relação até a hora que tivesse totalmente dentro dela. Eu fazendo parte da sua rotina e não conseguindo tirar você da minha, vindo que nem cachorro pro seu colinho.

Relaxa, menina. Eu sou muito arredio, linda, lembra disso. Pensa que sou sozinho. Lembra que só me deixo fazer carinho quando me distraio. E olha, é verdade: não tem mais ninguém na parada. Nunca teve jogo, você sabe disso, só acabou. A culpa não é sua nem minha. É só que preciso me apaixonar logo e isso ninguém precisa te dizer que não aconteceu

Um comentário:

. disse...

então para que rodiar tanto? acha que machuca menos? eu não acho que machuca menos. acho que machuca mais ver como você contorna o todo, como chama a moça de linda, como mostra que é doce querendo dizer que não é. isso, sim, é áspero.