sexta-feira, maio 05, 2006

Sorrindo Sem os Dentes

Por André Debevc

Para início de conversa, virei o rosto, continuei andando sem dizer uma só palavra. Comecei assim pelo fim mas já conto a história, calma. Fiquei com a impressão de que o mais importate naquela noite tenha sido isso, de eu ter sorrido e virado a cara. Sorri sem mostrar um só dente, e segui com minha vida porque a consumação no bar não tinha chegado nem na metade ainda.

Voltando para casa, vasculho meu arquivo de canalhices e não consigo saber porque ela não queria mais ter contato comigo. Geralmente o fim de uma relação pega a estrada de afastameto, e cumprimentos esritamente necessários, depois que alguém pisa na bola. Eu não tinha pisado e estranhava tudo isso. Nunca achei que diálogos monossilábicos fossem ideais para nós, que num dia distante e galáxia muito distantes, trocamos carinhos e fluidos corporais.

Tudo bem que quando ela me comunicou o fim do relacionamento, e sua mudança para longe, eu acabei achando conforto e carinho nos lábios de algumas de suas conhecidas, mas ela já tinha deixado óbvio que não me queria. Se amigas queriam alegrar a vida e açucarar a minha rua da amargura, não seria eu que iria pará-las. Eu a quis de volta como um homem só quer uma mulher de volta em sua vida inteira – mas se não podia, só me restava colar meus cacos com cuspe...

Se eu tivesse colocado as fotos “sensuais” que tenho dela na Internet, ou coisa que o valha, tudo bem, mas nem isso eu fiz. Posso ter errado, como todo homem vivo, falível e imperfeito, mas nunca fiz nada que justificasse essa repulsa que ela tem de mim hoje. Sei que posso ser um canalha – já mereci até troféu por ter sido insensível, egoísta e algum outro defeito grave do qual não me lembro agora, com algumas mulheres sensacionais - mas não com ela. Fui bonzinho. Vai ver aí está a falha. Tem mulher que odeia isso.

Bom…sem trocadilhos, voltemos à vaca fria. Eu estava lá, bebendo com amigos, quando dou de cara com ela. Ela, que há poucos dias tinha me dito que preferia não ter contato, sentadinha de frente para mim. Juro que na hora, ouvi a gargalhada do destino, se mijando de rir. Minhas pernas pensaram em ficar bambas mas logo vi que aquele costume de deixar o peito disparar na presença dela, tinha caducado. Minha dignidade me pedia que eu sorrisse e virasse sem esboçar uma palavra. Simples.

Antes tivesse pulado o muro todas as vezes que tive chance quando estava com ela. Antes tivesse sido um canalha de dar inveja aos personagens de Nélson Rodrigues. Todo aquel bom-mocismo, para dar nisso. Oi e olhe lá. Dois estranhos sem passado. Se eu tivesse sido mau como fui com mulheres que nunca senti dentro do peito, teria sido melhor. Pelo menos saberia porque tudo que ela deseja de mim é distância. Mudei depois dela. Errei com mulheres a torto e à direito. Não deixei ninguém ter tanto acesso a mim como ela teve. Fiquei mais cínico, cortante.

Tem coisas que a gente não entende nunca. Vai ver, para mim, essa é uma dessas coisas mal resolvidas que incomodam sempre, feito o osso que um dia quebrei jogando bola. A gente tem que saber escolher o que deixar para trás. E às vezes só se dá conta que começou a aprender quando vê que não precisou engolir silêncio nenhum, e pode simplesmente sorrir. Sorrir sem mostrar um só dente. Sorrir – como diz o Veríssimo – só com a boca. Até porque se entendo alguma coisa de mulher isso quiz dizer que…motel nem pensar, né? E eu que pensei que tivesse deixado aquela porta aberta, pronta para um encontro assim, casual e descompromissado. Quanta ingenuidade.

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